Chuvas no Litoral: moradores relatam a tensão de morar em áreas de risco em Ubatuba
O medo de perder a vida e a incerteza do que fazer marca rotina dos caiçaras do Perequê-Mirim
A voz de dona Maria mistura resignação e conformidade com o fato de ter de deixar a casa por conta da chuva. “A gente vai levando, é a vida, né!”, relata a mulher, que mora há 12 anos no local.
Maria José Ferreira é uma das quatro pessoas que moram em um dos imóveis que que deverão ser interditados no bairro Perequê-Mirim nesta quinta-feira, 26, após as fortes chuvas.
O muro de um dos imóveis localizado abaixo da casa de dona Maria, nas proximidades da rua Poço Fundo, caiu e fez com que as edificações vizinhas ficassem com a estrutura comprometida. Visando salvaguardar vidas, alguns moradores foram orientados a deixar suas residências.
Perigo vem do céu
Assim como a chuva, que causa apreensão aos moradores, vem do alto, o perigo para as casas construídas nas encostas da Serra do Mar vem de cima: com o solo encharcado, aumenta-se a possibilidade de deslizamentos de terra que podem ser fatais, tirando também a tranquilidade de quem reside na região.
“Eu tenho o sono leve. Começou a chover eu já fico preocupada, me levanto, não consigo dormir mais. Esta noite mesmo eu não consegui dormir, depois das 3h começou aí eu fiquei pra lá e pra cá e não dormi mais, fiquei pensando, porque tem as arvores, aí a gente fica preocupada com os filhos e tudo”, relata dona Maria, que mora com o esposo e dois filhos.
Desalojados
O drama de quem vive em áreas de risco não se resume a esperar o que vai acontecer quando começa a chover, mas o que fazer quando o próprio teto passa a representar um risco à própria vida.
Mauro Cesar Luiz dos Santos mora há mais de 30 anos no Perequê-Mirim. O homem, que há 15 anos sofreu um acidente que o impossibilitou de continuar trabalhando, teve a casa interditada e terá de ficar em um abrigo cedido pela prefeitura, contudo, ele sabe que a solução é encontrar outro lugar para viver.
“Tenho que arrumar uma casinha, dar um tempo e arrumar uma casinha pra gente mudar daqui, né, porque (no fim das contas) fica muito complicado pra mim, eu uso sonda, sinto muitas dores, não posso deitar no chão”, conta Mauro, que mora junto dos filhos.
Além dos imóveis interditados nesta quinta-feira e outros que passaram por avaliação, uma outra casa das proximidades já estava desocupada desde as chuvas de fevereiro deste ano.
A residência interditada fica ao lado a casa de ‘Seu’ Mauro, que relembra quando o imóvel foi desocupado.
“Não caiu nada aqui, caiu tudo para o lado de lá, aqui não caiu nada, só um ‘barrinho’, foi tirado e pronto”, lembrou o morador, que emendou “Deus é bom, da mesma forma que aconteceu com ele, poderia acontecer comigo também”, disse o homem enquanto fazia o sinal da cruz.
Balanço
Segundo Wagner Pego, coordenador da Defesa Civil de Ubatuba, pelo menos uma casa interditada deverá ser demolida e outros deverão permanecer desocupados.
“O objetivo é sempre salvar vidas, poupar, a Defesa Civil trabalha sempre com a prevenção”, reforça Wagner.